Validade do Contrato verbal de franquia

Ementa: NOVA LEI DE FRANQUIAS, CONTRATO VERBAL, VALIDADE, DIREITO CIVIL E EMPRESARIAL.

Sumário: Possibilidade de validade de Contrato verbal de franquia, seu reconhecimento pela jurisprudência brasileira, e suas implicações diretas no encerramento das atividades de unidade franqueada com retorno, no todo ou em parte, dos investimentos dispendidos. 

Fundamentação: Sobre o tema franchising, cumpre esclarecer inicialmente que, em 26/12/2019, foi publicada no diário oficial a Lei 13.966/2019, ou seja, a nova lei de franquia, que revogou integralmente a antiga Lei 8.955/1994. Essa nova lei trouxe significativas modificações, especialmente com relação a elaboração do documento mais importante das negociações de franquias, a Circular de Oferta de Franquia, que passou dos antigos 15 itens obrigatórios para 23, dentre outras novidades. 

Importante salientar que, diante da promulgação da lei acima mencionada, os Contratos antigos, ou seja, que já estavam em plena vigência sob a égide da lei que foi revogada, também precisaram se ajustar as determinações contidas na nova legislação, e mais, que o prazo para essa adequação se esgotou em 26/03/2020, quando entrou em vigor a nova lei sobre o tema. 

Cabe ressaltar ainda que, especificamente quanto à forma do instituto da FRANQUIA, nada mudou, pois conforme se verifica na redação do artigo 7o, da Lei 13.966/2019, a concessão da licença do direito de uso da marca de produto consagrado, continua sendo por meio de contrato, o qual deverá ser, via de regra, na forma escrita, após o cumprimento dos requisitos elencados na referida lei, artigos 2o e 3o, seus incisos e parágrafos, para fins de diferenciar esse tipo de negócio jurídico da representação comercial, por exemplo, como se observa na decisão do TJ/RS, abaixo transcrita:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR RESCISÃO IMOTIVADA. REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. REGÊNCIA. FRANQUIA. CARACTERIZAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR RESCISÃO. AFASTAMENTO. SUCUMBÊNCIA. INVERSÃO. A diferença entre a representação comercial regida pela Lei 4.886/1965 e a franquia, franchising ou franchise, disciplinada na Lei 8.955/94, é que naquela há a intermediação dos serviços, mas a sua execução continua a cargo da empresa representada, enquanto nesta o franqueado não só usa o nome do franqueador, mas pratica diretamente, em seu próprio nome, todos os atos que ao franqueador competiriam. Caracterizado o contrato de franquia, não há que se falar em direito à indenização pela rescisão, conforme disposto no art. 27, “j” da Lei 4.886/65, impondo-se a improcedência da ação movida com este único fundamento e a inversão dos ônus sucumbenciais. RECURSO ADESIVO NÃO CONHECIDO. APELO DA PARTE RÉ PROVIDO. APELO DA PARTE AUTORA PREJUDICADO. UNÂNIME. (Apelação Cível, No 70057740847, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alex Gonzalez Custodio, Julgado em: 20-04-2016)

Entretanto, em termos práticos, a concessão de franquia, através de contratos verbais, ocorre com muita frequência no dia a dia do meio empresarial, seja por negligência das partes envolvidas, ou mesmo, por divergência nas cláusulas contratuais, quando a unidade franqueada já está em pleno funcionamento. Porém, a jurisprudência consagra a admissibilidade do contrato verbal de franquia, quando devidamente configurados seus demais elementos caracterizadores, tais como: oferecimento da Circular de Oferta de Franquia, demarcação de área de atuação, fornecimento de know-how e tecnologia, entre outros. 

Trata-se da prevalência do direito material sobre a forma e, assim também aplicável aos contratos de franquia, uma vez que ambas partes auferem vantagens e assumem obrigações, conforme jurisprudência do STJ abaixo transcrita:

(…) 
4. À luz da realidade dos fatos, a existência de um contrato verbal de franquia entre as partes não pode ser desconsiderada quando, ainda que inexistentes a aceitação expressa e o preenchimento dos requisitos constantes da Lei 8.955/94, ambas as partes passaram a agir como se franqueada e franqueadora fossem. (STJ, AREsp 1623398, REL. MIN. NANCY ANDRIGHI)

Em resumo, a jurisprudência reconheceu que, na contratação, acima da forma, o que se pressupõem é a livre manifestação de ambos os contratantes visando a um objetivo definido. Na hipótese seria a concessão de licença de direito de uso de produto de marca consagrada no mercado, através de uma franquia. 

Cabe destacar também, que a competência do foro, nos casos de ausência formal de contrato, é no sentido de que seria aquele da sede da franquia adquirida, conforme se observa da decisão proferida pela Ministra Maria Isabel Galotti, do STJ, abaixo transcrita: 

(…) 
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ALEGAÇÃO DE CONTRATO VERBAL CELEBRADO ENTRE AUTOR E RÉUS. AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. COMPETÊNCIA. FORO DA SEDE. ART. 100, IV, “A”, DO CPC. (STJ, RESP 1531014, REL. MIN. MARIA ISABEL GALOTTI)

Ademais, tanto a doutrina como a jurisprudência, consideram de suma importância as informações contidas na Circular de Oferta de Franquia. Haja vista, que são os elementos ali estabelecidos que formarão a convicção e o convencimento do franqueado para adquirir determinada marca. 

Com relação a extinção do contrato de franquia, está deverá ocorrer nos termos do contrato assinado entre as partes, quando houver. Caso o contrato escrito não tenha sido formalizado, esta poderá ocorrer na forma da legislação vigente. 

Quanto ao direito de ressarcimento dos valores investidos e dos lucros cessantes, cabe referir que a jurisprudência entende ser possível, desde que comprovada a omissão do franqueador nas informações contidas na Circular de Oferta de Franquia, bem como o nexo causal entre essa omissão e a frustação das expectativas do franqueado, como se observa na jurisprudência abaixo colacionada: 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE FRANQUIA (FRANCHISING) CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CULPA DA EMPRESA FRANQUEADORA. PROVA. EXISTÊNCIA. EXIGÊNCIA UNILATERAL DE ALTERAÇÃO DO PONTO COMERCIAL. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. LUCROS CESSANTES. DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. RESCISÃO CONTRATUAL: Comprovado nos autos que o desfazimento do negócio ocorreu por culpa exclusiva da empresa franqueadora, que exigiu alteração do ponto comercial no qual a empresa franqueada estava se instalando, mesmo após ter participado ativamente do processo de escolha do ponto comercial original. Obrigação da franqueadora de dar suporte técnico a empresa franqueada, nos termos do art. 2o da Lei 8.955/94, e conforme estabelecido na Circular de Oferta de Franquia. Recurso não provido. LUCROS CESSANTES: Consiste o lucro cessante na perda do ganho esperável, na frustração da expectativa de lucro, na diminuição potencial do patrimônio da vítima. No caso dos autos, entretanto, não vislumbro a possibilidade de fixação de lucros cessantes. O estabelecimento comercial franqueado sequer entrou em atividade, razão pela qual não é possível concluir acerca do sucesso do empreendimento, muito menos do lucro que, eventualmente, a loja poderia obter. Não há nada nos autos que permita concluir de forma segura qual o lucro esperado pelo empreendimento, de modo que os lucros cessantes não passam de mera projeção, sem nenhuma prova concreta. Recurso provido, no ponto. DANOS MORAIS: Os fatos narrados autorizam indenização pelo inquestionável dano moral sofrido, não podendo este ser tratado apenas como descumprimento contratual, quando a quebra do contrato gerou evidente frustação da autora que sequer deu início a atividades de seu empreendimento, somado este fato ao expressivo valor desembolsado entre custos com taxa de franquia e demais gastos. Todavia, é caso de reduzir o valor fixado pela sentença para R$ 20.000,00, pois adequado às peculiaridades do caso concreto, que não caracteriza enriquecimento sem causa. Recurso provido em parte, no ponto. SUCUMBÊNCIA: Em razão do parcial provimento da empresa demandada, é caso de redimensionar e redistribuir os ônus da sucumbência. Vedada a compensação. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível, No 70079955050, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 12-12-2019) 

Conclusão: Diante do exposto, conclui-se que o entendimento da jurisprudência brasileira vai no sentido de reconhecer como válido o contrato verbal de franquia, desde que presentes os elementos que o diferenciam de outros contratos, como por exemplo, do contrato de representação comercial. 

Além disso, que esse reconhecimento implica também na manutenção das garantias impostas pelo Direito Civil, no sentido de rescisão unilateral, ressarcimento de valores dispendidos, bem como dos lucros cessantes, desde que comprovado o nexo causal entre a omissão das informações do Franqueador na Circular de Oferta de Franquia, e a frustração das expectativas do Franqueado. 

Autor: Iolanda Regina Monteiro da Rosa/OAB/RS 69065 e PR/103098