A duvidosa previdência complementar pública

Bem atual a discussão sobre a viabilidade da previdência complementar pública, quando o município de Porto Alegre aprova o PLCE 07/18, instituindo tal regime para os servidores públicos municipais.

Numa análise simplista verifica-se que o sistema previdenciário se baseia num aporte de contribuições, que visam a prevenir o infortúnio e a segurança financeira do futuro. Para isso, os valores descontados dos contribuintes devem formar um fundo, que será administrado para garantir o pagamento dos benefícios no futuro. Trata-se do chamado sistema de capitalização. Sem ter em caixa um dinheiro arrecadado e bem investido, não haverá como pagar benefícios futuros, obviamente.

O sistema de seguridade do poder público está quase falido exatamente porque jamais as contribuições descontadas dos servidores foram aplicadas em fundo adequado para constituir a base de retorno aos contribuintes. Como funciona atualmente o sistema? O governo federal paga, por exemplo, uma quantia de R$10.000,00 ao servidor e desconta 11% sobre o total quitado. Então, do valor bruto já é descontada a quantia de R$ 1.100,00. Depois, incidem os demais descontos como o imposto de renda na fonte. Mas onde fica a importância descontada de R$1.100,00? Na verdade, é um valor que apenas deixa de sair do caixa único administrado pela Fazenda, servindo a omissão de recolhimento a fundo respectivo para compensar o custeio da máquina pública, como remuneração dos servidores, saúde, educação, etc. Não há fundo algum para garantir nada.

Quando o governo paga R$ 10.000,00 a um servidor na realidade está sabendo que gastará apenas o líquido depositado, isto é, o resultado do desconto de seguridade e imposto de renda. Quem ganha R$ 10.000,00 recebe líquido pouco mais de R$ 7.000,00. O resto fica no caixa único para suportar outras despesas, que nada têm a ver com a garantia da seguridade.

Como poderá funcionar um sistema previdenciário dessa maneira administrado? Obviamente, fadado ao fracasso.

A seguridade pública caracteriza um completo desvirtuamento do regime de capitalização. A contribuição paga pelo servidor não é aplicada para sua segurança futura, mas para cobrir rombos de orçamentos mal geridos e de uma administração pouco competente em todos os níveis de poder da federação. Corrupção, obras inacabadas, ineficiência da máquina estatal.

Não adianta sustentar que no projeto de previdência complementar municipal em referência as coisas são diferentes. Existe um conselho para administrar tal programa previdenciário. Mas quem garante que o governo recolherá a contribuição extra descontada dos servidores se nem consegue pagar em dia os vencimentos ou os fornecedores?

Décadas após o pagamento de tal previdência complementar o que poderão encontrar os contribuintes: falta de dinheiro para pagar aposentadorias e pensões? Mudança de condições para perceber benefícios? Diminuição de valores ou percentuais dos benefícios?

A previdência privada é fiscalizada pela administração pública e pode sofrer intervenção se deixar de administrar os fundos de modo a dilapidar seu patrimônio e sacrificar os contribuintes no futuro. Todavia, quem fiscaliza a previdência complementar mantida pela administração pública?

FÁBIO BITTENCOURT DA ROSA – Advogado/RS

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